Por que se Deve Defender a Autopropriedade e Não o “Direito à Vida”

Tempo de Leitura: 3 minutos

Uma das principais diferenças do Liberalismo Clássico para o Libertarianismo é a ordenação de seus valores fundamentais. Para os liberais clássicos os valores fundamentais são aqueles descritos por John Locke: respeito à vida, liberdade e propriedade, normalmente apresentados nessa sequência.

Já na Ética Libertária, o valor fundamental e primário é a propriedade privada. Os valores da vida e da liberdade são consequência do respeito à propriedade. Assim, para os libertários, a liberdade só é possível quando se respeita a propriedade privada, qualquer desvio dela é uma violação da liberdade individual. O mesmo acontece com o respeito à vida, ele está intimamente conectado ao respeito à autopropriedade.

Isso quer dizer, então, que respeito à vida e respeito à autopropriedade são a mesma coisa? Não. O conceito de autopropriedade possui uma evolução em relação ao conceito de respeito à vida apresentado por Locke e pelos outros clássicos. E essa diferença se percebe justamente ao se definir a propriedade como um direito negativo.

Ao se falar em direito à vida uma série de direitos positivos são atrelados ao conceito. Vou citar alguns exemplos que deixam isso claro:

Exemplo 1: Imagine que a pessoa A está passando pela beira de um rio e vê uma pessoa B se afogando. Se B tem direito à vida, A tem a obrigação de salvar B, independente do que levou B a estar nessa situação. A única exceção, talvez, é se o risco de morte de A na tentativa for muito grande, mas existe, portanto, um conflito entre o direito à vida de A e de B. Agora, se ambos possuem direito à autopropriedade, seria muito virtuoso pela parte de A salvar B, mas ele não estaria cometendo nenhum crime ao não tentar salvá-lo (sugiro a leitura deste texto para entender a diferença entre um ato imoral e um ato antiético).

Exemplo 2: Um médico é o único capaz de realizar uma determinada cirurgia que exige extrema perícia (apenas para ficar mais evidente o ponto, mas poderia ser qualquer médico). Se os pacientes em estado grave, com risco de morte, tem o direito à vida, então o médico tem a obrigação de atender esses pacientes, mesmo que isso signifique para ele abrir mão de passar tempo com a família, de atender outros pacientes em estado menos grave ou mesmo de buscar outros objetivos de vida. Já no caso de cada um ter direito à sua autopropriedade, seria muito bondoso e moral por parte do médico tentar salvar o maior número de vidas, talvez nem cobrar por isso, mas não se pode dizer que ele tem essa obrigação.

No livro “A Ética da Liberdade”, Rothbard utiliza uma explicação da professora Judith Thomson que demonstra muito bem essa distinção e a importância dela:

“Para algumas pessoas, ter o direito à vida inclui ter o direito a receber ao menos as necessidades mínimas suficientes para se continuar vivo. Mas suponha que o que na verdade é o mínimo suficiente que um homem necessita para continuar vivo seja algo que ele não tem nenhum direito de receber? Se eu tenho uma doença terminal e a única coisa que irá salvar minha vida é o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril, então, ainda assim, eu não tenho o direito de receber o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril. Seria extremamente gentil da parte dele voar da costa oeste para me prover isto… Mas eu não tenho absolutamente nenhum direito ante qualquer um de tal maneira que ele devesse fazer isso por mim” (THOMSON,1971, p. 55-56 apud ROTHBARD, 2010, p. 161).

Perceba como nesses casos a liberdade de alguns pode ser totalmente tolhida dependendo do conceito de “direito à vida” que é escolhido. Talvez não tenha sido a intenção dos liberais clássicos utilizar o conceito de direito à vida como superior ao da propriedade, mas os limites não ficaram claros.

Foi pela falta de conhecimento desta distinção, ou pela falta de clareza, que uma série de direitos positivos para “proteger a vida” foram criados com pouca ou nenhuma resistência por parte dos liberais da época.

Muitos liberais atuais continuam defendendo o direito à vida, na maior parte das vezes o priorizando em relação ao direito de propriedade. O que eles não percebem é como com isso estão colocando em risco a liberdade de todos e abrindo brechas para os positivistas se utilizarem dos valores liberais para impor seus abusos de poder e tolher os direitos negativos de todas as pessoas.

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Referências:

ROTHBARD, Murray N.. A Ética da Liberdade. Tradução de: Fernando Fiori Chiocca. 2a edição. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. 354p.

KAESEMODEL, G. P. A Autopropriedade e a Ética Libertária. MISES: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics, v. 6, n. 1, 6 Apr. 2018. Disponível em <https://revistamises.org.br/misesjournal/issue/view/23>

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3 Comentários

  1. Frank Souza

    “Imagine que a pessoa A está passando pela beira de um rio e vê uma pessoa B se afogando. Se A tem direito à vida, B tem a obrigação de salvar A, independente do que levou B a estar nessa situação.”

    Creio que inverteram as variáveis. O correto não “Se B tem direito à vida, A tem a obrigação de salvar B”

  2. Ramon Arthur

    eu acha que o direito a vida é o direito de se proteger (auto-defesa)

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