A Metodologia e a Epistemologia Austríaca- Parte 2

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Em minha última publicação sobre esse tema, tratei de fazer algumas explicações e objeções acerca da metodologia de economistas neoclássicos e mainstream, e breves explanações sobre a metodologia usada pela Escola Austríaca em sua ala majoritária.

Nesta publicação pretendo tratar exclusivamente e de forma mais aprofundada a epistemologia da Escola Austríaca, e parte dos teoremas econômicos que ela deriva de suas metodologias de análise.

Entre os mais prodigiosos e famosos economistas austríacos temos Ludwig von Mises, que realizou diversas contribuições para a Escola Austríaca além de gerar intrigantes debates sobre a funcionalidade de uma economia socialista. Dentre suas principais teses e contribuições uma das mais importantes é a praxeologia, um estudo acerca dos propósitos da ação humana que busca derivar logicamente teoremas econômicos a partir de um axioma.

Tal axioma se baseia na proposição “Humanos agem valorando fins e usando meios escassos”, e sua veracidade é auto evidente, não no sentido de obviedade psicológica, onde o próprio fato de compreender essa afirmação gera um sentimento psicológico de convicção, pois como veremos posteriormente, as implicações e as categorias vindas desta premissa podem não fornecer tal sensação psíquica de convicção. Antes de explicar o porque disso faz-se necessário entendermos que ao dizermos que “humanos agem” estamos nos referindo a sua capacidade deliberada e autônoma de usar recursos escassos para atingir fins (que aqui são entendidos como os objetivos de um determinada ação), e esta asserção é válida pois o próprio ato de negá-la incorre numa contradição, haja vista que para afirmar “Humanos não agem” ou “Eu não estou agindo” tal pessoa iria usar meios escassos, como o seu corpo, visando certos fins, como tentar refutar esta premissa básica da praxeologia, em outras palavras, ela iria agir para negar a sua própria ação, o que caracteriza tal ato como uma auto-contradição.

Mas como a afirmação de que “Humanos agem buscando certos fins usando meios escassos” tem alguma relação com o estudo da economia? Quais são as pretensões do uso desta proposição? Pois bem, acontece que é possível derivar teoremas econômicos a partir de certas categorias que estão implícitas no ato de agir, entre elas vemos que ao agir o ser humano busca um objetivo: sair de um estado de satisfação que ele considera desagradável e alcançar um outro melhor, e esta ação tem como finalidade alcançar esse estado de satisfação superior. Então podemos afirmar que entre as outras alternativas que estavam disponíveis para serem perseguidas por nós, escolhemos uma em específico pois o valor que damos a ela é maior que o das outras. Podemos também concluir que utilizamos meios escassos para atingir nossas finalidades, esses meios são os recursos necessários para que nossa ação se concretize, e são escassos na medida de que não são infinitos e que eles são insuficientes para que possamos atingir todos os nossos fins, ou seja, é impossível termos a plena satisfação, pois para que possamos atingir todos os nossos fins seria necessário que os meios para todas as nossas necessidades ocupassem todo o espaço-tempo, e seria absurdo cogitar tal possibilidade, e vale lembrar que ao atingirmos um certo fim, uma nova necessidade surge pois estamos constantemente valorando situações que possam aumentar nossa satisfação.

Toda vez que um indivíduo incorre numa ação ele revoga as demais alternativas que ele poderia ter escolhido alcançar, isto significa que qualquer ação feita pelo ser humano incorre em custos, esses custos são o valor subjetivo dado as outras alternativas disponíveis para serem realizadas. Podemos dizer então que o indivíduo ao concluir uma ação, pode avaliar se ele poderia ter escolhido incorrer em uma outra ação que ele valorava mais, ou seja, quando uma determinada ação é escolhida para ser concluída, caso ela tenha um valor maior para o indivíduo do que as alternativas que ele revogou, pode-se dizer que ele obteve ganhos, caso contrário, ele teria perdas, e existe sempre um risco do indivíduo ter perdas.

Como foi demonstrado mais acima, é possível derivar de uma simples proposição auto evidente alguns teoremas econômicos, tais como a utilidade marginal (o valor dos bens econômicos é definido pela apreciação que ele tem para um indivíduo de forma proporcional para o valor que ele estipula ao fim que pretende alcançar com este meio), a lei da preferência temporal (é preferível para um indivíduo, em igualdade de circunstâncias, receber um bem no presente do que no futuro, a não ser que ele considere que tenha maiores ganhos ao receber tal bem no futuro ), entre diversos outros.

Desta forma, percebe-se que pelo raciocínio apriorístico, isto é, pela derivação de conclusões a partir de certas propriedades e conteúdos proposicionais de proposições prévias, é possível concluir e derivar teoremas econômicos, tal como o é com a proposição base “humanos agem”, e isto é esclarecido por Mises no seu tratado “Ação Humana” (página 65–66):

O raciocínio apriorístico é meramente conceitual e dedutivo. Não pode produzir nada além de tautologias e raciocínios analíticos. Todas as suas implicações derivam logicamente das premissas e nelas estão contidas.

[…]A cognição a partir de raciocínio meramente dedutivo também é criativa e abre para a nossa mente acesso a regiões antes inacessíveis. A tarefa mais importante do raciocínio apriorístico é, por um lado, revelar tudo o que se pode inferir das categorias, conceitos e premissas e, por outro, mostrar o que não se pode inferir. Sua função é tornar claro e evidente o que antes era obscuro e desconhecido.

Mises define todas as implicações e teoremas derivados das suas proposições base de “categorias da ação humana”, e que estes estão implicitamente contidos nelas.

Para Mises é importante que tenha-se em mente que existe uma diferença entre os métodos de análise das ciências econômicas e das ciências naturais, pois a economia não lida com constantes intemporais, como na física, então seria necessário haver uma teoria com consistência lógica interna e bem fundamentada, para que todos os fatores que determinam os fenômenos econômicos possam ser devidamente estudados, já que nem todas as determinantes destes fenômenos são quantificáveis ou observáveis (como a lei da utilidade marginal), e que portanto não estariam suscetíveis a testes empíricos.

Gostou do artigo? Sobre esse tema, leia o maravilhoso livro de Murray Rothbard: Homem, Economia e Estado.

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