Direito a Privacidade: conflito com Direito a Propriedade Privada?

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A Ética Libertária tem como princípio reconhecer apenas direitos negativos. Seria o direito à privacidade um direito negativo e, portanto, compatível com o libertarianismo?

A primeira coisa que precisamos entender é que privacidade está relacionada à proteção de informações pessoais. E informações não são, per se, um bem econômico, isto é, não é um bem escasso e, portanto, não está sujeito a ser apropriada originalmente por alguém.

Entretanto, existem bens econômicos que protegem a privacidade de alguém, como uma cortina em uma janela, um insulfilm em um carro, uma senha de um internet banking ou de uma rede social ou uma criptografia que impede o acesso à determinada informação, apenas para citar alguns exemplos. Enquanto a informação per se não é escassa, esses bens que a protegem o são.

O direito positivista contemporâneo parte do princípio de que a privacidade é um “direito” (junto com muitos outros… mas não vamos falar nisso agora), e como tal, as pessoas seriam “donas” de suas informações. Ou pior: as pessoas seriam “donas” de todas as informações que se referem a elas.

Ou seja: mesmo que alguém possua determinada informação, não pode utilizar os seus próprios recursos para divulgá-la. Alguém que tirou uma foto de alguém com sua própria câmera não pode utilizá-la para divulgar determinada informação. Alguém que ouviu sem querer informações sobre a vida privada de determinada pessoa, digamos em um café, por exemplo, não pode usar suas cordas vocais ou seu próprio celular para divulgar essa informação que ela obteve.

Porém, devido à impossibilidade técnica de se aplicar isso de forma universal, uma vez que se acabaria com a liberdade de expressão e praticamente minaria os assuntos permitidos na imprensa, recorreu-se a uma gambiarra: pessoas públicas, isto é, famosas, de reconhecimento não possuem esse direito em sua totalidade, sendo permitido falar sobre elas ou utilizar a imagem delas sem autorização prévia.

Mesmo ignorando-se a dificuldade de definição de quem é uma pessoa pública, ainda assim fica clara a quebra do princípio da universalidade. Além disso, fica claro também, como o “direito a privacidade” de uma pessoa gera uma obrigação positiva sobre outra determinada pessoa, a impedindo de utilizar a propriedade dela da maneira que melhor lhe convêm, mesmo isso não gerando nenhum dano à propriedade de outros.

Isso quer dizer que em uma sociedade livre qualquer um pode “invadir” a privacidade dos outros? Não. As pessoas podem utilizar suas propriedades para impedir o acesso a suas informações.

Porém, uma vez que uma informação é obtida de forma legal, isto é, sem a invasão de uma propriedade, nada pode impedir que ela seja divulgada pelo detentor da informação, a não ser por um contrato voluntário.

No mundo digital é a mesma coisa, apenas fica um pouco mais complexo porque os bens não são materiais. Além disso, os termos de uso têm grande relevância. Na maior parte das redes sociais, por exemplo, você não é efetivamente o proprietário da sua conta, apesar de você protegê-la com um senha sua.

Você é mais como um locatário, ainda que não pague “aluguel” na maior parte das plataformas: você tem acesso exclusivo, mas a rede social pode utilizar suas informações (de forma agrupada, nunca individualizada, segundo os termos de uso) e pode impedir seu acesso no caso de violação de alguma regra nos termos de uso.

Em outros casos, como uma carteira de bitcoin ou outras criptomoedas, você é o efetivo proprietário desse bem escasso, com total controle sobre o bem, apesar de ainda precisar do acesso à tecnologia da blockchain para ser operacional.

Quando um hacker invade uma conta de um aplicativo mensagens, por exemplo, ele está invadindo a propriedade de alguém. Essa conta é um bem escasso, só pode ser utilizado por uma pessoa de cada vez, e utilizá-la no lugar do efetivo proprietário impede o uso da parte dele. Isso sem falar que o hacker pode também ter violado os termos de uso, podendo ser responsabilizado frente à empresa também (se ele tiver utilizado a plataforma para ter acesso à conta violada).

E no caso de pessoas que tem suas fotos íntimas divulgadas na internet? O crime também está na obtenção da informação, que pode ter acontecido através de invasão da propriedade alheia, como no caso do hacker acima, ou através da violação de um contrato ou acordo. Por exemplo um casal que se filma, fazem um acordo (escrito ou verbal) de que não vão divulgar essas informações e após o término uma das partes divulga na internet.

O crime está no não cumprimento do contrato (não vou entrar aqui na questão das cláusulas de rescisão ou de quebra, fica para outro artigo), e não na divulgação do material.

Terceiros que façam a divulgação não tem nenhuma relação com a vítima, a não ser, novamente, que tenham obtido as informações de forma ilegal. Alguns vão dizer que a questão violam a reputação da pessoa que está no vídeo.

Entretanto, a reputação também é informacional, não é um bem. É um conjunto de percepções que as outras pessoas fazem sobre alguém. Uma pessoa nunca teria controle da sua reputação e, portanto, é impossível dizer alguém é “proprietário” da sua reputação.

Assim demonstramos como em uma sociedade livre não é necessário um “direito de privacidade”, que uma clara definição de direitos de propriedade é o suficiente para abarcar os principais problemas decorrentes do que se costuma chamar de violação da privacidade. Além disso, a aplicação desse direito de forma positivista, como é feito hoje, gera uma série de consequências e uma série de violações da propriedade privada das pessoas, inclusive e principalmente de pessoas não envolvidas diretamente no conflito.

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